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Cineclube Corte Seco retoma atividades com exibição de filmes do Cariri

  • Foto do escritor: Corte Seco
    Corte Seco
  • 4 de jun.
  • 4 min de leitura

Escrito por Raíssa Fernandes


Após uma curta pausa, o Cineclube Corte Seco marcou o retorno às suas atividades no dia 7 de maio. O evento reuniu estudantes e professores interessados em cinema e, especificamente, nas produções realizadas no Cariri cearense. Como debate inicial, a urgência da abertura de uma graduação em Cinema e Audiovisual foi colocada em pauta pelos atuais coordenadores do Corte Seco: Rodrigo Capistrano e Isadora Rodrigues.


Vermelho de Bolinhas (2025)




Abrindo a programação do Cineclube, Vermelho de Bolinhas, de Joedson Kelvin e Renata Fortes, levou os espectadores até o coração de Santana do Cariri. Nos primeiros segundos, em meio à apresentação da cidade até então desconhecida, a curiosidade é instigada pelo pequeno tecido vermelho com bolinhas brancas no canto de uma estrada de barro. O detalhe, ainda que sutil, antecipa o caminho que os diretores optaram por tomar.


Entre espaços urbanos e a natureza que compõem as “imagens-mundo” do narrador, a aparição da cabaça reposiciona o direcionamento da obra. Em um primeiro momento, a história da menina Benigna Cardoso da Silva toma uma forma mais descritiva, com datas, nomes, recorte de uma página de jornal e cantigas religiosas dos fiéis. A relação da população de Santana com a beata entra aqui quase que despercebida, borrada, aguardando o momento em que certamente ganharia mais destaque.


Enquadrando uma moldura vazia, o filme então traz a problemática da falta de uma representação fiel da imagem de Benigna. Sem uma fotografia, o primeiro registro da menina surge em 2001, no formato de um retrato falado. Com um semblante um pouco maduro e de traços sérios e finos, a primeira imagem de Benigna foi rapidamente aceita pelos devotos e moradores de Santana. Em 2011, com a adoção da causa pela Igreja Católica, a imagem do retrato falado foi sendo gradualmente alterada para seguir os preceitos já estabelecidos.


Com a beatificação de Benigna pela Igreja e a oficialização de um retrato utilizando recursos técnico-científicos, o narrador então retorna a Santana para investigar as alterações da cidade e a relação dos devotos com as novas e grandes mudanças. No centro da cidade, lojas e pousadas levam o nome da beata. Nas “mesinhas de santo” dentro das casas dos moradores, as diferentes imagens parecem divergir e convergir em um mesmo ponto. Reafirmando o sentimento exposto, uma das devotas aparece dizendo: “Para mim é uma só. A fé é uma só.”


Ao final, entrando de uma vez no vermelho de bolinhas, as últimas cenas exploram a adoção e o acolhimento da história de Benigna pelas mulheres de diferentes idades. Preferindo perder a própria vida a aceitar a violência sexual e o pecado contra a castidade, a figura da beata reflete em cada traço do rosto dessas mulheres. A inocência das crianças ganha uma nova significação com o clássico vestido estampado.


Dentro do exercício de investigar como uma memória sobrevive sem um rosto e como é possível contar uma história sem uma imagem, o documentário de Joedson e Renata abraça o profundo vermelho de bolinhas brancas.


Vale dos Dinossauros (2023)


Com Santana do Cariri sendo mais uma vez palco de narrativa, o filme “Vale dos Dinossauros”, dirigido por Ythallo Rodrigues, estabelece sua atmosfera ao misturar a tradição religiosa com os fósseis do acervo paleontológico da cidade.

 Uma figura com vestimenta estranha pousa em Santana, como uma mancha excentricamente colorida, ela destoa da tranquilidade de um ambiente quase vazio. No primeiro momento, as poucas interações da personagem geram curiosidade. Ao encontrar refúgio no quarto de uma pousada, ela, já despida de sua armadura de retalhos, inicia o trabalho de relatar fluxos de consciência enquanto investiga a história daquele local.


 Sem a vestimenta protetora que a acompanhou na chegada, a protagonista trafega no transe do delírio cotidiano e nos pensamentos que se confundem entre real e imaginário. A visita ao museu, o primeiro encontro com a história da menina Benigna, o passado da cidade, os ossos e a solidão de um lugar quase vazio a perseguem.


 A angústia explode no filme na cena em que ela, sozinha no quarto, chora com “Soluços” de Zezé Motta tocando ao fundo. Cortando a música de forma abrupta, a cena seguinte entrega a personagem observando com curiosidade a sua própria vestimenta pendurada, ainda dentro da sonorização do ambiente, é possível escutar o que seriam os sons dos dinossauros que ali viveram. Aqui, a trilha evidencia e orienta os momentos de delírio e dramatização da personagem


 Mesmo com o momento de descontração entre os três personagens no bar, o final do filme ressalta o desejo de um maior reconhecimento do local. A protagonista, movida pela necessidade de abraçar a misticidade e o passado de Santana, entra também em uma busca por algum pedaço de si mesma.


  Kariri - Silêncio Estrondoso


 Fortalecendo o debate iniciado antes das exibições, o curta de Yasmin Ariadne retoma a urgência da necessidade da criação de uma graduação em Cinema e Audiovisual no Cariri cearense. Seu filme de montagem recorta alguns dos grandes momentos do cinema caririense, conseguindo construir um diálogo entre as obras clássicas e as mais contemporâneas.


 A narrativa construída pela colagem de imagens adota um potencial que alterna entre o cômico e o sério em vários momentos. No meio do curta, dando uma pausa nas cenas com diálogos, a entrada da  música serve como um guia no meio das imagens que representam tão bem a cultura da região. A fé, as apresentações de reisado, os paus-de-arara e a receptividade característica do povo caririense dançam conforme a melodia.


 Em uma belíssima homenagem, a obra também serve como uma boa introdução ao cinema produzido no Cariri. A pulsão de criatividade e a potência cultural da região merecem melhores condições para serem desenvolvidas. A última mensagem, exibida logo após os créditos se destaca no fundo preto:

 

O Cariri MERECE uma graduação em Cinema.


 
 
 

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